A inglesa Pauline Diana Baynes (1922 – 2008) é conhecida como ilustradora de diversas obras de J.R.R. Tolkien, inclusive as publicadas no Brasil, como As Aventuras de Tom Bombadil, Mestre Giles d’Aldeia, Ferreiro do Bosque Maior e A Última Canção de Bilbo. Também os sete volumes que compõem As Crônicas de Nárnia de C.S. Lewis ostentam suas ilustrações, que nesse caso se tornaram canônicas – isto é, as figuras têm a mesma autoridade do texto na medida em que retratam Nárnia.
A infância de Pauline tem paralelos curiosos com a de Tolkien: ambos passaram a primeira infância fora da Inglaterra (ela na Índia, ele no Estado Livre de Orange no sul da África); ambos foram para a Inglaterra com as respectivas mães, ainda bem jovens (ela com a irmã e ele com o irmão), passando a ocupar uma sequência de casas enquanto os pais permaneciam no estrangeiro. Seu talento de ilustradora surgiu cedo, e aos 19 anos já havia conquistado uma vaga na Slade School of Fine Art [Escola Slade de Belas Artes] em Londres, o que lhe permitiu aperfeiçoar ainda mais sua técnica, além das habilidades inatas e das adquiridas em cursos anteriores. Estudou diversos artistas de renome e também a obra dos ilustradores anônimos de manuscritos medievais. Durante a 2ª Guerra Mundial trabalhou com as forças armadas britânicas, fazendo modelos e mapas, o que lhe valeu muito quando mais tarde se pôs a desenhar os mapas da Terra-média de Tolkien e da Nárnia de Lewis.
Sua associação com JRRT começou quando ilustrou Mestre Giles; o autor afirmou que suas obras eram mais do que meras ilustrações e chegavam a constituir um tema colateral, e que amigos haviam comentado que o texto se reduzira a um comentário dos desenhos. Várias outras colaborações entre escritor e desenhista se seguiram a esse primeiro contato.
As Crônicas de Nárnia entraram para o portfólio de Baynes depois que Lewis admirou sua arte para Mestre Giles. As capas, os frontispícios e as ilustrações internas dos sete livros das Crônicas foram a consequência. Somente os direitos autorais dessas obras teriam tornado Baynes milionária, mas ela negociou com a editora um preço de apenas £100 por livro, o que em moeda atual equivale a umas 2.500 libras, ou cerca de 16.000 reais. Em 1998 ela coloriu todos os desenhos das Crônicas em aquarela, para uma edição comemorativa do centenário de nascimento de CSL.
Mas as ilustrações de que Pauline Baynes mais se orgulhava eram as quase seiscentas que, ao longo de dois anos, criou para A Dictionary of Chivalry [Um Dicionário da Cavalaria] de 1968, de autoria de Grant Uden. A capa, a folha de rosto e todas as quase 350 páginas dessa obra enciclopédica foram ilustradas por Baynes. O dicionário contém dados sobre costumes, eventos, trajes e armamentos, lugares e vultos históricos da Idade Média. Abrange os séculos XII a XVII, incluindo citações de antigas crônicas; muitos comentaristas opinam que as ilustrações são mais valiosas que o próprio texto. Os desenhos em preto e branco se inspiram nos dos manuscritos medievais, e os quadros coloridos mostram o domínio que Pauline Baynes tinha sobre diferentes estilos, desde o retrato de um personagem histórico até a ilustração de um episódio dramático.
A capa do livro é uma fantasia de mito e heráldica. Os desenhos estão nas margens externas das páginas, e muitas vezes os que estão em páginas opostas se complementam, como é o caso das ilustrações dos verbetes Charlemagne [Carlos Magno], Meals [Refeições] e Tournament [Torneio]. Sir Bedivere representa o cavaleiro da corte do Rei Artur que lançou à água a espada real Excalibur; Henry V [Henrique V] retrata o rei que em 1415 derrotou o exército francês, muito mais numeroso, e foi celebrado por Shakespeare. O verbete Genealogy [Genealogia] é ilustrado por uma longa sucessão de nobres e seus brasões, enquanto que Saint George [São Jorge] traz a figura do dragão que ameaça uma donzela. Minstrels [Menestréis] mostra dois desses cantores e poetas, em diferentes estilos, e Order of the Blue Garter [Ordem da Jarreteira Azul] acompanha uma descrição da origem e evolução dessa importante condecoração cavaleiresca.
As obras que realizou para A Dictionary of Chivalry valeram a Pauline Baynes a medalha Kate Greenaway para as melhores ilustrações de livro em 1968. O livro é uma bela publicação, que vale a pena ser explorado pelas suas interessantes descrições, mas esse dicionário editado há 55 anos adquire um charme especialíssimo graças às obras de Baynes. O texto quase se reduz a mero complemento dos desenhos que o iluminam.